Toda família grande passa por desafios incontáveis. Aqui não seria diferente. Três filhos representam três universos diferentes, distintos e díspares (apelando pros sinônimos). E quando a gente afirma que cada ser humano é um universo, não é de brincadeira. Agora, amplie esses universos para mundos em formação, cujo Deus onipotente e absoluto é você.
Isso, é você mesmo. Esse que está lendo aí.
Não corre, não! Você deve estar se questionando que nem você próprio está formado, como será capaz de se responsabilizar pelo universo alheio? É verdade.
Acontece que nós pais não temos muito tempo para refletir sobre isso. A gente simplesmente não tem tempo. O que a gente pode fazer é ler a respeito, trocar experiências, tatear e testar muito sem nunca desistir. Assim como fazem os Highlanders.
Houve uma época em que eu e meus filhos estávamos passando por um período de adaptação, quando eu resolvi sair do emprego. Antes, essa convivência diária era relegada às creches. Então, eu posso dizer que ficava com a educação de fim de semana, já que dia útil era aquela coisa correndo, rapidinha.
No início eu fiz muita besteira. Andava gritando, me descabelando, praguejando, botava de castigo, ou deixava o pau quebrar, porque né? Evitava bater... ainda assim, meu filho do meio, o Sr. Cabeça de Bolinha, andou ganhando uns puxões de orelha e apertões. Os puxões de orelha eu aprendi com marido. Não fui criada com puxão de orelha, só com apertões. Ele talvez sim. Fato, é que foi horrível esse período. Sem contar, que as crianças passaram a se tratar na base dos berros. Tudo era grito! A casa ficou um inferno. Eu gritava, eles gritavam, marido gritava.
Claro, toda essa gritaria não veio do nada. Era um reflexo do período de dificuldades que vínhamos passando. Marido então, não estava acostumado a lidar com tanta dívida e privação, por isso se irritava por qualquer coisa.
Eu decidi acabar com a tempestade. Além de estar vendo e sentindo na pele a reprodução dos meus erros, me digam, quem é que gosta de viver debaixo de um inferno diário? Pois é.
Comecei diminuindo o tom, sento mais coerente nos castigos, menos egoísta com eles, porque né, as crianças precisam da nossa atenção de verdade e não só no papel. Então a modificação partiu de mim e mais uma vez foi contagiando a família.
Por fim, marido melhorou e todos foram se equilibrando.
De qualquer forma, eu tenho uma dificuldade quando o assunto é disciplinar. Estou acostumada a falar grosso e ser ouvida. Tanto Pacotinho, quanto Dona Miúda entendem no olhar, embora não obedeçam de imediato, maneiram o tom. Mas o Sr. Cabeça de Bolinha nunca foi assim. Ele faz o que tem vontade. Você pode secar o moleque, soltar raios laser por todos os orifícios do corpo, pode fazer o jutso do punho suave*, que não adianta.
Outra coisa que ele repudia é papo sério. A coisa mais difícil que existe, é você conseguir prender meu filho do meio num sermão. Tem que ter o dom. E eu não tenho. Aliás, tenho imensa dificuldade em fazer essa criança ficar ouvindo meu sermão. Eu literalmente caio na pilha, meio que desisto e por fim dou castigo.
Ontem mesmo passei vergonha na padaria. O Sr. Cabeça de Bolinha está naquela fase de falar o que lhe dá na telha, sem olhar a quem ou onde. Então na padaria, estávamos comprando mortadela Ceratti, a melhor mortadela do mundo na minha opinião e a qual andamos privados de comer, já que a situação financeira apertou.
Bem, estava tão animada, que sem perceber, comecei a quase dar pulinhos de alegria. A padaria é um ovo, ao que o menino solta no meio de todos:
SR. CABEÇA DE BOLINHA - Mãe, tá se balançando por quê? Das duas uma, ou você quer fazer xixi, ou vai botar um ovo!
Olhos arregalados dos presentes me encaram.
Ele tem 7 anos e claro, não faz a menor ideia do significado do que estava dizendo. Ele, que já estava de castigo por não ter me atendido de manhã, ganhou mais um dia. Mas esse não é o ponto fraco do Cabeça de Bolinha. Eu deveria ter ficado atenta. O ponto fraco dele é DR. E ele deve ter puxado a mim, porque detesta discutir a relação. E foi exatamente isso que eu vi o pai fazendo com ele pela manhã, com absoluta maestria, coisa de quem tem o dom mesmo.
Aliás, eu preciso ajoelhar no milho todo dia e agradecer o marido e pai que dei às crianças. Ele sabe atuar exatamente na lacuna que eu deixo, quando o assunto é disciplina! Veja bem, não levantou a voz, não gritou, não puxou orelha. Ele simplesmente com o tom calmo, pegou na mão do filho, que naquele momento se comportava como um peixe ensaboado, tentando fugir a todo custo; pediu que o olhasse nos olhos e repetia o sermão.
O Sr. Cabeça de Bolinha olhava pro chão, olhava pro teto e se recusava a encarar. Enquanto o pai segurava sua mão firme, mas com a voz suave, enumerando tudo aquilo que ele deveria mudar, conclamando-o a se colocar no lugar dos outros, mostrando a ele, como ele andava exigente conosco e com os irmãos, desrespeitando a todos e no entanto, não fazia a sua parte.
Nem comigo marido fala desse jeito!
Impressionante! Uma conversa de mãos dadas, olho no olho, deu mais resultado que todos os meus castigos juntos.
O Sr. Cabeça de Bolinha ficou um tempo ali no quarto vendo desenho, depois ao se levantar, avisou que tomaria banho, a seguir se vestiu sozinho para a escola, como ainda tinha tempo, foi bater uma bolinha no playground, voltou e ficou brincando sem se alterar ou brigar com os irmãos.
Em contrapartida, pedi também aos outros que respeitassem esse momento dele. Que não o provocassem ou implicassem.
Como vocês podem ver mamães, os papais de hoje têm muito a nos ensinar.
Mãos dadas, olho no olho e carinho na voz.
Anotado.
*Jutso do Punho Suave - Técnica ninja mostrada no anime Naruto Shippuuden, onde o personagem Neji, luta quase sem encostar a mão em seu oponente, utilizando quase exclusivamente a força de seu chacra para derrubar o adversário.
5 comentários:
Nada que uma boa conversa não resolva. Levei puxões de orelha do meu pai qdo criança, até o dia que me revoltei. Ele puxou minha orelha na casa da minha avó paterna e fui chorando no colo dela e disse:"olha o que seu filho fez em mim".
Cara, minha vó ficou doida.. chamou meu pai e deu maior comida de rabo nele. Resultado: me senti vingada e ele nunca mais puxou minha orelha. Humpf.
big beijos
Kkkkk, Lulu, adorei a comida de rabo. Nunca te vi falando assim. Pois é, nunca é só um puxão de orelha, né? Isso é o tipo de coisa que marca e pelo qual eu não quero ser lembrada!
Você acabou de contar a prática do que a minha mãe vive falando na teoria. Ela se formou em pedagogia e entende muito de psicologia infantil. Sempre que vemos determinados comportamentos na rua ou onde for, comentamos isso. SEMPRE o diálogo é a melhor solução!
Já disse hoje que eu adoro os seus posts? ehehehe
Beijocas
rendasepaetes.com
Amiga... sou como você! Uma negação pra disciplina, aqui o pequeno obedece mais ao pai e eu tenho q ir até ele, conversar e por fim... lá vai castigo.
Às vezes me sinto uma negação...
Somos duas a agradecer pelo pai dos nossos filhos.
bjs,
Flavia, você fala as coisas de uma maneira tão gostosa. Parece que eu estou vendo a cena. Obrigada minha linda por ter a oportunidade de ler tantas coisas legais.
Beijocas
Yvonne
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